quarta-feira, 31 de março de 2010

Expressar amor é ser RIDÍCULO?!


Todas as Cartas de Amor são Ridículas
Álvaro de Campos (heterônimo de Fernando Pessoa)

Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.

As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.

Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.

A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)

Caso queira escutar esse poema recitado pela cantora e intérprete Maria Betância, é só clicar no link http://www.youtube.com/watch?v=jTSlw9L_uSE e boa audição!!!

terça-feira, 16 de março de 2010

Um amor inesquecível!

Imagem extraída de http://franciscolibanio.blogspot.com/2009_05_01_archive.html
O "adeus" de Teresa
Castro Alves

A vez primeira que eu fitei Teresa,
Como as plantas que arrasta a correnteza,
A valsa nos levou nos giros seus...
E amamos juntos... E depois na sala
"Adeus" eu disse-lhe a tremer co'a fala...

E ela, corando, murmurou-me: "adeus".

Uma noite... entreabriu-se um reposteiro...
E da alcova saía um cavaleiro
Inda beijando uma mulher sem véus...
Era eu... Era a pálida Teresa!
"Adeus" lhe disse conservando-a presa...

E ela entre beijos murmurou-me: "adeus!"

Passaram-se tempos... sec'los de delírio
Prazeres divinais... gozos do Empíreo...
... Mas um dia volvi aos lares meus.
Partindo eu disse - "Voltarei!... descansa!..."
Ela, chorando mais que uma criança,

Ela em soluços murmurou-me: "adeus!"

Quando voltei... era o palácio em festa!...
E a voz d'Ela e de um homem lá na orquestra
Preenchiam de amor o azul dos céus.
Entrei!... Ela me olhou branca... surpresa!
Foi a última vez que eu vi Teresa!...

E ela arquejando murmurou-me: "adeus!"

segunda-feira, 8 de março de 2010

Mulher...

Mulher no jardim, Monet (1867)
O chapéu violeta
Mário Quintana

Aos 3 anos:
Ela olha pra si mesma e vê uma rainha.
Aos 8 anos:
Ela olha para si e vê Cinderela.
Aos 15 anos:
Ela olha e vê uma freira horrorosa.
Aos 20 anos:
Ela olha e se vê muito gorda, muito magra,
muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado,
decide sair mas, vai sofrendo.
Aos 30 anos:
Ela olha pra si mesma e vê muito gorda,
muito magra, muito alta, muitobaixa, muito liso
muito encaracolado, mas decide que agora não tem
tempo pra consertar então vai sair assim mesmo.
Aos 40 anos:
Ela se olha e se vê muito gorda, muito magra,
muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado,
mas diz: pelo menos eu sou uma boa
pessoa e sai mesmo assim.
Aos 50 anos:
Ela olha pra si mesma e se vê como é.
Sai e vai pra onde ela bem entender.
Aos 60 anos:
Ela se olha e lembra de todas as pessoas
que não podem mais se olhar no
espelho. Sai de casa e conquista o mundo.
Aos 70 anos:
Ela olha para si e vê sabedoria, risos, habilidades,
sai para o mundo e aproveita a vida.
Aos 80 anos:
Ela não se incomoda mais em se olhar.
Põe simplesmente um chapéu violeta e vai se divertir com o mundo.
Talvez devêssemos por aquele chapéu violeta mais cedo!

domingo, 7 de março de 2010

Mulher...


Com licença poética
Adélia Prado

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.